
Salão dos Novos
precisa rever critérios
Excesso de trabalhos e falta de curador-geral, maculam o evento que iniciou na década de 80
CHARLES NARLOCH
ESPECIAL PARA O ANEXO
Florianópolis - Difícil é a tarefa de comentar um salão de novos artistas com as características ainda existentes no tradicional e conservador Salão Municipal dos Novos, de Joinville. Sua formalidade começa por sua criação. O evento foi instituído em 1982 por força de um decreto municipal (4461/82). Se por um lado a lei assegura sua realização bienal, por outro, nem sempre o evento é prestigiado como deveria, por parte daqueles que se sentem obrigados a promovê-lo. Bem ou mal, há de se ressaltar que o certame joinvilense tem sua importância e vem resistindo intacto à dança das cadeiras que respondem pela Casa da Cultura e pela Galeria Municipal Victor Kursancew, chegando agora à sua décima edição. Desta vez, a seleção das obras ficou sob responsabilidade da crítica de arte Nadja de Carvalho Lamas, da professora de história da arte Berenice Mokross, e do artista plástico Ricardo Kolb Filho. Inquestionável, portanto.
O que se pode questionar - e talvez até se deva, com o intuito de colaborar - são os aspectos intrínsecos ao evento, que urge de uma mudança rigorosa e total. Nos anos em que aconteceu na Galeria Municipal, era comum ver o salão com um número excessivo de obras selecionadas, literalmente montadas umas sobre as outras, até o teto, ou em painéis totalmente inadequados. Impossível sequer pensar em uma montagem que favorecesse a analogia de linguagens. Como a premiação sempre foi minguada, foram criados prêmios de incentivo de exposição - válidos - e as antiquadas menções honrosas, ironicamente apelidadas de "menções honrorosas", tamanha sua futilidade e defasagem.
Nesta edição, talvez por tradição, 40 artistas foram selecionados, um número que continua sendo excessivo para o espaço disponível no Museu de Arte de Joinville (MAJ), onde a mostra continuará exposta até 6 de janeiro. É preciso lembrar que a arte se traduz no espaço, e que obras de arte precisam de "ar para respirar e viver". Outro detalhe que chama a atenção é a seleção de apenas uma ou duas obras convencionais de alguns artistas, provavelmente porque, supostamente, um dos objetivos deste salão é "mostrar o caminho". Como se sabe, trata-se de uma prática em desuso, pois não permite estabelecer uma avaliação de unidade e coerência entre os trabalhos apresentados. Percebe-se aqui a ausência de um curador-geral, que defina claramente estes critérios numéricos à comissão. Também triste é a infra-estrutura precária do MAJ, com painéis obsoletos que interferem na leitura das obras. Os salões em si, em processo de extinção, só sobreviverão se adotarem princípios de contemporaneidade técnico-administrativa.
O resultado global desta edição é, portanto, sofrível, com algumas exceções. A sala de entrada, felizmente, contém os maiores tesouros da mostra. Rodrigo Cunha, de São José (SC) e Mari Inês Piekas, de Almirante Tamandaré (PR), surpreendem pelo tratamento limpo e bem acabado de suas gravuras. Enquanto Rodrigo traz à tona os aspectos da vida cotidiana urbana, Maria Inês é lúdica, conferindo a seus trabalhos uma visão bucólica e de fantasia. Nena Borba, de Florianópolis, merece o prêmio aquisitivo por sua série de bordados sobre papel, que discursam a poética urbana de forma sutil e delicada. Cabe lembrar, porém, que em salões maiores os bordados correm o risco de serem vistos como "clichês", por terem sido excessivamente utilizados por artistas brasileiros, como Bispo do Rosário e Leonilson.
Também merecedora de prêmio é a artista Leila Zotz, de Florianópolis, com seus pequenos "Arranjos para Terrorismo", tanto pela contemporaneidade (atualidade do tema e técnica) quanto pelo esmerado e perfeito acabamento das obras. Impedindo a passagem sob uma porta, há os premiados sifões brancos de Jefferson Peres, de Joinville, mas a montagem delimitada parece prejudicar os possíveis desenhos que as peças fariam soltas no ar, como foram expostas na 31ª Coletiva dos Artistas de Joinville.
Outro bom trabalho prejudicado pela ausência de infra-estrutura do museu foi o da artista Vanessa Roncalio, de Florianópolis. Seu trabalho em pelúcia branca, que exige distância de outras obras e limpeza para contemplação, ficou sem sentido sobre um inadequado bloco expositor forrado com carpete ocre, deixando clara a ausência de atualização museográfica do espaço expositivo.
Dentre as obras interessantes, mas de menor impacto, estão as de Lilian Busse, que recebeu prêmio aquisitivo por seus trabalhos em acrílica sobre couro reproduzindo fotos antigas de família, que remetem às serigrafias pop. Vale ainda apreciar as fotografias de Giovanna Locatelli, o vídeo-arte de Eugênio Siqueira da Costa, ambos de Joinville, as linoleogravuras de Josiane Aires, de Curitiba e a xilogravura de Ingrid Muniz, também premiada.
Charles Narloch, curador do Salão Nacional Vítor Meireles entre 1995 e 1998, anexo@narloch.com
http://www1.an.com.br/2001/dez/23/0ane.htm

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